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Bill Russell x Wilt Chamberlain

Camisas de times da NBA em promoção!

Por Bruno Tacchi

Primeiramente, gostaria de explicar que toda essa matéria é baseada no livro “The Book Of Basketball” (“O Livro de Basquetebol”, em português), do autor Bill Simmons, um insider da ESPN. Recomendo o livro para todos que querem aprender mais sobre a NBA (e que têm um inglês bom, pois ainda não vi nenhuma versão traduzida).

Todo fã da NBA já deve ter se perguntado (ou espero que o tenha feito) quem foi melhor: Bill Russell ou Wilt Chamberlain? O homem dos 11 anéis ou o homem dos 100 pontos?

Quem foi melhor: o homem dos 11 anéis, Bill Russell, ou o homem dos 100 pontos, Wilt Chamberlain?

É esperado que, após mais de 40 anos, ainda exista esse tipo de debate, e enquanto o fã de basquete existir, ainda haverá esse tipo de dúvida. Pois Bill e Wilt dominaram a década de 60, os dois gigantes, responsáveis em grande parte pela NBA que temos hoje.

Não pretendo deixá-los curiosos, então vou contar logo a resposta que Bill Simmons deu em seu livro (e que concordo plenamente): Bill Russell. Simmons gastou aproximadamente 27 páginas do seu livro de 700 para explicar e comprovar seu ponto de vista, enquanto eu, pretendo gastar um pouco menos que 27 páginas.

Para justificar seu ponto de vista, Bill Simmons utiliza da tática de quebrar alguns mitos desta discussão, que, aparentemente, a grande maioria dos fãs de basquete acredita. E é isso que eu farei nesse artigo, exatamente como no livro.

MITO Nº1: Russell tinha um time melhor?

Bom, vamos nos situar na NBA da década de 1960: imagine a NBA atual, sem nenhum jogador estrangeiro, somente metade dos jogadores negros e o número de times caísse de 30 para 8. Não é esperado que cada time tenha uns 3 All-Star’s e uns 4 ou 5 bons role player‘s? Com certeza. Então, bem-vindo à NBA de 1956 a 1966.

Para provar o que estou falando, vai ser necessário listar cada uma das temporadas e os mais importantes integrantes dos times. Então, tende a ficar meio cansativo. Pule se quiser, e retorne a ler no item “Resumindo“.

Assim foram as temporadas após Russell entrar na liga:

1957: Primeiro ano de Bill Russell na NBA. O Boston Celtics tinha dois bons armadores – Bill Sharman e o MVP, Bob Cousy – e três excelentes calouros – Russell, Tommy Heinsohn e Frank Ramsey. Enquanto o St. Louis Hawks, adversário das finais, tinha Bob Pettit (2x MVP), Ed Macauley (HOF) e Slater Martin (HOF, Segundo Time Ideal da NBA naquela temporada), além de Charlie Share, Jack Coleman e Jack McMahon (três ótimos role player‘s). Como Boston levou as finais no jogo 7, após duas prorrogações, creio que os times estavam bem equilibrados.

1958: Os Hawks vingaram-se da temporada anterior graças à revelação Cliff Hagan (HOF, Segundo Time Ideal da NBA) e ao tornozelo torcido de Russell. Novamente, talento equivalente em ambos os lados.

1959: Até agora, primeiro ano que realmente houve uma vantagem de talento para o lado de Boston. Três companheiros de time no Primeiro Time Ideal da NBA – Russell, Cousy e Sharman -, dois armadores promissores – Sam Jones e KC Jones -, o sexto homem do ano – Ramsey -, e um dos melhores alas ofensivos da liga – Heinsohn. Mesmo assim, ainda foram necessários 7 jogos para o Celtics passar do Syracuse Nationals, time liderado pelos membros do top 50 da NBA, Hal Greer e Dolph Schayes. Nas finais, Boston varreu facilmente o Lakers de Elgin Baylor.

1960: Celtics bate o Philladelphia Warriors em 6 jogos, nas finais de divisão (equivalente às atuais finais de conferência), e precisa de 7 partidas para derrotar, nas finais da NBA, o Hawks, que contava com quatro futuros membros do Hall da Fama do basquete, incluindo um novato chamado Lenny Wilkens. Enquanto isso, Wilt ganha o troféu de MVP como calouro, jogando com Arizin (10 eleições seguidas ao All-Star game), Tom Gola (5x All-Star seguidos, HOF), Guy Rodgers (4x All-Star) e Woody Sauldsberry (Calouro do Ano na temporada 1958 e All-Star em 1959). Boston tinha um pouco mais de poder de fogo, mas não muito. Não é como se Wilt estivesse preso a jogadores como Drew Gooden e Larry Hughes, que nem LeBron James em 2007 (risos).

1961 e 1962: Sequência de anos em que Boston teve um dos times mais carregados da história da NBA. Em 1961, o Celtics facilmente vence Nationals e Hawks, em busca do quarto título da liga, enquanto Wilt é varrido por um Nationals mais fraco, e manda seu técnico embora – o primeiro de muitos. Em 1962, o Celtics precisa de 7 jogos para passar do Warriors, de Chamberlain, e uma prorrogação no jogo 7 das finais, contra o Lakers, de Elgin Baylor e Jerry West, ganhando seu quinto título. Como já disse, os times eram realmente equilibrados.

1963: O time de Boston enfraquece-se quando Sharman se aposenta, Cousy e Ramsey caem de produção, e o novato Havlicek ainda não é o Hondo que marcou época na equipe alviverde. O Celtics necessita de 7 jogos para vencer o Cincinnati Royals (liderados pelos HOF’s Oscar Robertson, Jack Twyman e Wayne Embry) e mais 6 para derrotar os Lakers (de West e Baylor). Enquanto isso, Warriors se muda pra San Francisco, termina com uma campanha de 31 vitórias e 49 derrotas, não indo aos playoffs, mesmo com Wilt, Rodgers, Tom Meschery (All-Star), Al Attles (grande defensor) e Willie Naulls (4x All-Star).

1964: Cousy se aposenta e nenhum Celtic consegue entrar no Primeiro Time Ideal da NBA naquela temporada. Só que isso não impede Boston de derrotar um excelente time de Cincinnati (liderado por Big O e pelo Calouro do Ano naquela temporada, Jerry Lucas) e facilmente bater o Warriors de Chamberlain (agora com o futuro HOF Nate Thurmond no elenco). Boston vence o título mesmo sem um grande destaque nas posições de armador ou ala-pivô. E, além de Russell, não havia mais nenhum jogador no top 20 de rebotes, e ninguém teve mais de 5 assistências de média por partida.

1965: Ramsey aposenta e Heinsohn cai de produção. Mesmo assim, o Celtics termina com seu melhor desempenho na era Russell (62 vitórias e 18 derrotas), batendo o Lakers nas finais, graças a seu Big Three e a um ano monstruoso de Satch Sanders. Enquanto isso, o San Francisco Warriors perde 17 partidas seguidas e troca Wilt para o Philadelphia 76ers. E, pela primeira vez, o talento do time de Chamberlain pode se comparar com o de Russell: há o armador Larry Costello (6x All Star), o ala-armador Hal Greer (10x All-Star), o ala Chet Walker (7x All-Star), o ala-pivô Lucius Jackson (All-Star, 8º na lista de reboteiros da temporada) e dois bons role player‘s (Dave Gambee e Johnny Kerr). Por isso que a série Sixers-Celtics foi até a última jogada do Jogo 7, no Boston Garden, acabando com uma jogada bem conhecida pelos celtas de todo o mundo: “HAVLICEK STOLE THE BALL!” (em português, “Havlicek roubou a bola!”).

1966: Heinsohn aposenta, KC Jones cai de produção e o Celtics é obrigado a depender de veteranos (Naulls e Mel Counts) e trocas (Don Nelson e Larry Siegfried) para ajudar o Big Three na temporada final (como técnico) do lendário Red Auerbach. Pela primeira vez, Boston não termina com o melhor desempenho da temporada regular, perdendo pro Sixers de Wilt (55 vitórias contra 54). Isso acaba não importando muito, pois Boston derrota Philly em 5 jogos e ganha o jogo 7 das finais contra Los Angeles por 2 pontos. Philly tinha mais talento nessa temporada, pelo menos no papel.

1967: KC Jones aposenta, outro veterano integra o Celtics (HOF Bailey Howell), enquanto Russell tem dificuldades no seu primeiro ano como técnico-jogador. Esse é o ano de Philly, devido a uma ajuda extra do calouro Billy Cunningham e ao fato de que Wilt descobriu que não precisava pontuar sozinho para fazer seu time ganhar. Sixers termina sua temporada com a famosa marca de 68 vitórias, vence o Celtics em 5, bate o Warriors em 6, e Wilt vence seu primeiro título. A chance perfeita para ele, quando se depararam o melhor time possível de Wilt contra o pior time possível de Bill.

1968: Wilt lidera a liga em assistências (sim, isso realmente ocorreu) e Philly termina a temporada com um recorde de 8 vitórias a mais que o Celtics. O Celtics, já com um time de idade, vira um 3-1 nas finais de conferência contra o 76ers, e derrotam um forte time do Lakers na finais, para Russell conquistar seu 10º título. Após o fim da temporada, Philly manda Wilt para Los Angeles.

1969: Com Russell e Jones chegando no fim da carreira, todos desacreditam do Celtics, quando eles terminam em quarto no leste. Na primeira rodada, eles derrotam o Sixers em 5 jogos, um time claramente melhor que o do Celtics. Em seguida, eles derrotam o Knicks em 6 (aquele mesmo time que ganha as finais de 1970 e 1972). E nas finais, novamente contra o Lakers, o Celtics vira uma desvantagem de 2-0, ganhando o jogo 7 em Los Angeles.

Resumindo: Em 10 anos que Russell e Chamberlain se enfrentaram, os times de Russell claramente tiveram vantagem contra os de Chamberlain por 4 temporadas (1961, 1962, 1963 e 1964) e uma pequena vantagem na primeira temporada de Wilt (1960). Em 1965, Boston e Philly eram um empate em questões de talento. De 1966 a 1969, Wilt jogou em times mais fortes. Em 6 dessas 10 temporadas, é possível descrever a disparidade de talento como “igual” ou “relativamente igual”.

Após tudo isso, a única clara vantagem que Russell teve foi ter Auerbach como técnico por 10 anos (detalhe: Auerbach afirmou que nunca seria capaz de treinar um jogador como Wilt). Para finalizar, Russell jogou com 4 jogadores no top 50 da NBA: Havlicek, Cousy, Sharman e Sam Jones. Wilt jogou com 6: Baylor, West, Greer, Cunningham, Arizin e Thurmond. Os companheiros de time de Russell, de 1957 a 1969, foram selecionados 23 vezes para os All-Star Games. Os de Wilt, de 1960 a 1973, figuraram na seleção dos Jogos das Estrelas durante 24 vezes. Sendo assim, por favor, nunca mais usem esse mito como argumento.

MITO Nº2: Russell não era um bom jogador ofensivo?

Nesse quesito, a história foi injusta com Russell. Enquanto muitos glorificam Bill Walton em 1977, muitos esquecem do quão importante Russell foi para o ataque do Celtics. Bill foi um dos melhores pivôs passadores (mais assistências de média – 4,7 – do que qualquer pivô com mais de 30 jogos de playoffs). O Celtics começava toda jogada de meia quadra por ele, após a aposentadoria de Cousy, pois eles não tinham um verdadeiro armador.

Para comprovar isso, aqui vai um trecho (livremente traduzido) da biografia de John Havlicek sobre a primeira temporada sem Russell:

“É imensurável o tanto que nós sentíamos falta dele (Bill Russell). Pessoas pensam nele em termos de defesa ou rebotes, mas ele tinha sido a chave para nosso ataque. Ele fazia o melhor passe mais do que qualquer outro jogador com quem joguei. E isso importava para jogadores como (Don) Nelson, (Bailey) Howell, (Larry) Sigfried, (Tom) Sanders e para mim. Nenhum de nós era jogador de um contra um… Russell nos tornou melhores jogadores ofensivos. A sua habilidade como passador, bloqueador e comandante do ataque sempre foi subestimada.”

No que tange a pontuação, Russell, mesmo quase nunca sendo a referência no ataque, conseguiu alcançar médias de 15 pontos na carreira, com 44% no aproveitamento dos arremessos de quadra.

Este é mais um mito que as pessoas continuam propagando, por simplesmente não terem disposição para pesquisar a respeito.

MITO Nº3: Estatisticamente, Wilt destruiu Russell?

É. Em temporada regular, sim, é possível afirmar que Wilt foi o maior de todos os tempos (em temporada regular!).
Wilt teve médias na carreira de 30.1 pontos, 22.9 rebotes e 4.4 assistências, enquanto Russell teve médias de 15.1 pontos, 22.5 rebotes e 4.3 assistências (segundo o bkref.com).

“E porque isso é um mito?”, você deve estar se perguntando. Então, vamos lançar outros números:

Confrontos diretos:
Russell 84 x 58 Chamberlain
Números nos Playoffs:
Russell: 165 jogos, 16.2 pontos, 24.9 rebotes, 4.7 assistências
Chamberlain: 160 jogos, 22.5 pontos, 24.5 rebotes, 4.7 assistências

Interessante como os números de Russell melhoram drasticamente em playoffs, enquanto os de Chamberlain pioram, não? Mesmo com Russell sendo a quarta opção ofensiva do Celtics (em média) e Wilt sendo a primeira opção de seus times. Wilt tinha mais pontos por jogo, mas todo o resto era equivalente, enquanto Russell era um melhor jogador defensivo, melhor companheiro de time e bem mais clutch. O que nos leva para os números a seguir:

Desempenho nas finais da NBA e de conferência:
Wilt: 48 vitórias e 44 derrotas
Russell: 90 vitórias e 53 derrotas
Desempenho em jogos 7:
Wilt: 4 vitórias e 5 derrotas
Russell: 10 vitórias e nenhuma derrota
Desempenho em jogos de eliminação:
Wilt: 10 vitórias e 11 derrotas
Russell: 16 vitórias e 2 derrotas

Além do assustador 11 a 2 a favor de Russell em títulos, não é?

Ademais, Russell era um excelente defensor, um dos melhores da história. E como os tocos só começaram a ser contados em 1973, nunca saberemos o quão impactante ele foi nesse setor, a não ser por relatos em biografias e vídeos dos jogos. O que sabemos é que Russell era capaz de fazer muitos adversários se contentaram com arremessos de fora, devido a sua presença colossal no garrafão. Agora, imagine o quanto isso foi importante para os Celtics numa liga onde havia poucos bons arremessadores. Muito, não?

Bill era capaz de afetar toda posse defensiva sem nem tem que dar toco em todas as tentativas. Além de que sua presença dava aos seus companheiros o luxo de somente ter que se preocupar com o ataque, pois não era necessário uma grande dedicação na defesa, com Bill Russell cobrindo todos seus erros.

Wilt era o melhor defensor, não chamado Bill Russell, da época. E porque ele não chegava ao nível do camisa 6 do Celtics? Isso ocorria por dois simples motivos:

Ao contrário de Russell, Wilt não era um saltador natural. Devido ao seu peso extra, ele demorava mais para pular, tendo que se agachar e se preparar antes de pular. Muitos oponentes aprenderam a arremessar antes que Wilt pudesse pular (Sam Jones foi um dos que aprendeu bastante a fazer isso. A cada arremesso que convertia, falava insultos como “muito tarde” ou “desculpa, Wilt”. Uma vez, nas finais de 1962, Wilt apelou e começou a correr atrás de Sam, depois que ele acertou um arremesso por cima do pivô e o insultou).

O outro motivo, que parece muito bobo (mas realmente não é inventado, juro) é que Wilt era obcecado com sua sequência de jogos sem ser ejetado. Por alguma razão qualquer, ele queria terminar sua carreira sem ser ejetado, então, muitas vezes, ele parava de ser agressivo defensivamente após a quarta ou quinta faltas, mesmo se isso fosse fazer com que seu time perdesse o jogo.

Traduzindo: Wilt Chamberlain ligava mais pra estatísticas do que pra vitórias.

Outro exemplo disso, foi a temporada em que ele liderou a liga em assistências. Em 1967, Wilt aparentemente descobriu as estatísticas de assistências e se tornou obcecado com elas. Wilt começou a passar arremessos fáceis para tentar computar mais assistências, checando o seu número de assistências inúmeras vezes durante o jogo, reclamando caso ele não tenha sido creditado por alguma assistência e até reclamando que seus companheiros de time estavam “desperdiçando seus passes”, quando eles erravam arremessos.

Só que, no final das contas, só dois números realmente são relevantes: Russell 11, Wilt 2. Números que são o reflexo da real importância que cada um tinha em quadra.

MITO Nº4: Wilt era uma boa pessoa?

Sim, Wilt era uma boa pessoa. Mas como uma boa pessoa como Wilt podia ser tão ruim como companheiro de time, é um mistério. Nos seus 6 primeiros anos de carreira, Wilt era fominha, obcecado com recordes de pontuação e demandou ser tratado diferente de seus companheiros de time.

Wilt teve brigas com todos seus técnicos, exceto por dois – Frank McGuire (talvez porque ele deixava Wilt arremessar o quanto quisesse, resultando num tal jogo de 100 pontos) e Alex Hannum. Acabou sua carreira tendo sido treinado por 9 técnicos diferentes, em 14 anos de NBA.

Chamberlain também era conhecido por culpar seus companheiros de time e técnicos pelas derrotas. Ele também tinha um péssimo hábito de distrair seus times em momentos cruciais (como nas finais de conferência de 1966, quando a Sports Illustrated lançou uma entrevista em que ele criticava seu time e o técnico Dolph Schayes, o que acabou com a moral de seus companheiros de time).

Pra finalizar, uma ultima história: em 1965, o dono do Lakers, Bob Short, fez um inquérito com seus jogadores sobre se ele deveria ou não contratar Chamberlain. O resultado final? 9 votos contra e 2 votos a favor. Quando alguém votaria contra ter Bill Russell no time? Nunca.

MITO Nº5: Com algumas jogadas aqui e ali, Wilt teria o mesmo número de anéis que Russell?

Primeiramente, quase todas as finais têm um momento essencial que decide o curso da série toda. Mas, aparentemente, muita gente não entende isso e usa esse argumento apenas a favor de Chamberlain. A matemática é simples, certos acontecimentos aconteciam com os times de Wilt no crunch time (Havlicek roubando a bola, Reed incendiando o Madison Square Garden em 1970, entre outros momentos) porque eles eram ruins nesse momento crucial. E porque eles eram ruins? Porque o próprio Wilt, o suposto líder do time, era ruim nestes momentos.

O medo que ele tinha em ser derrotado em jogos grandes o engolia. Às vezes, o medo se devia ao receio que tinha de ser mandado para a linha de lance livre (já que ele era horroroso nesse aspecto do jogo) ou também àquele temor patético de ser ejetado de algum jogo. Esses e outros detalhes o tornava bem inútil nos finais de jogos.

Como Rick Barry disse em sua biografia, Wilt fugia dos grandes momentos, com medo da pressão, com medo de que jogassem a culpa nele. Então, ele simplesmente sumia, se afastava das bolas importantes.

Eu poderia citar mais milhões de dados, estatísticas e histórias comprovando isso, mas todas apontam para o mesmo fato: Wilt não era clutch, enquanto seu nêmesis, Russell, amava os jogos importantes e costumava jogar muito melhor neles.

MITO Nº6: Jogadores e técnicos da época estão divididos sobre qual é o melhor jogador?

Bom, para responder isso, Bill Simmons leu um tanto de livros, autobiografias e relatos que mencionassem os dois, e escolheu 6 principais falas. Vou me dar ao luxo de transcrever somente 5 delas, as quais acredito serem mais relevantes, que são:

Butch van Brenda Kolff (Técnico do Lakers em 1969, no livro “Tall Tales”): “A diferença entre Russell e Wilt era essa: Russel perguntaria, ‘O que eu preciso fazer para melhorar meus companheiros de time?’ Então ele faria. Wilt honestamente pensava que o melhor jeito para seu time ganhar seria quando ele estive no melhor ajuste possível. Ele perguntaria ‘Qual é a melhor situação para mim?'”

Jerry West (Ala-armador do Lakers entre 1960 e 1974, no livro “Goliath”): “Eu não quero desmerecer o Wilt porque eu acredito que só Russell foi melhor, e eu realmente respeito o que Wilt fez. Mas eu tenho que dizer que ele não ajustaria para você, você que teria que se ajustar para ele.”

Jerry Lucas (Bigman de Royals, Warriors e Knicks, entre 1963 e 1974, no livro “Tall Tales”): “Wilt era muito obcecado com recordes: ser o primeiro a liderar a liga em assistências, ou ter a maior porcentagem de arremessos de quadra. Ele cumpriria uma meta, depois iria atrás de outra. Russell só faria uma pergunta: ‘O que eu posso fazer para nos fazer ganhar?'”

Bill Russell (No livro “Second Wind”): “Aparentava, para mim, que Wilt, às vezes, era ambivalente sobre o que ele queria conquistar do basquetebol. Qualquer um que mude seu caráter e seu estilo de jogo muitas vezes durante sua carreira, está propício a não ter certeza sobre qual das muitas potenciais conquistas ele quer perseguir. É perfeitamente possível que um jogador não faça das vitórias sua primeira prioridade – dinheiro, recordes, fama, etc. – e eu, muitas vezes, sentia que Wilt fez algumas escolhas deliberadas em suas ambições.”

Wilt Chamberlain (Na autobiografia, “Wilt”): “Para Bill, todo jogo – todo jogo de campeonato – era um desafio, um teste para sua masculinidade. Ele levava o jogo tão a sério que ele vomitava no seu armário antes de quase todos os jogos. Mas eu tendo a olhar o basquete como um jogo, não uma questão de vida ou morte. Eu não preciso de títulos de cestinha da temporada ou de ganhar campeonatos para provar que eu sou um homem. Tem muitas outras coisas bonitas na vida – comida, carros, garotas, amigos, a praia, liberdade – para ficar tão emocionalmente envolvido com basquete. Eu acho que Bill sabia que eu me sentia assim, e eu acho que ele tanto sentia inveja como repudiava minha atitude. Em uma mão, eu acho que ele desejava poder aprender a levar as coisas mais levemente também, em outra mão, acho que ele deve ter sentido que com minha habilidade natural e disposição a trabalhar duro, meus times poderiam ter ganhado um campeonato da NBA todo ano se eu estivesse totalmente comprometido com a vitória como ele estava… Eu queria ter ganhado todos aqueles anéis, mas eu realmente penso que eu cresci mais como um homem nas derrotas do que Russell nas vitórias.”

Depois desses 5 relatos, fica claro que havia uma preferência por Bill Russell na época. Assim como qualquer pessoa com uma mente sã também iria preferir.

Concluindo, Bill Russell ganha essa batalha não por ter números e estatísticas astronômicas. E sim, porque ele foi o melhor jogador de basquete de sua era. Porque ele jogava por vitórias, pelo seu time, e não por acumular números. Sacrificava-se toda noite de jogo em busca não de ser o melhor, mas sim de fazer seus companheiros jogarem melhor. E, afinal de contas, é sobre isso que é o esporte que amamos.

OBS: Artigo publicado originalmente em 31 de julho de 2016

10 comentários

  • POIS, EXCELENTE MATERIA,FICA DIFICIL SABER QUEM FOI MELHOR, MAS COMO SOU TORCEDOR DO CELTICS, PREFIRO BILL RUSSELL..;)

  • Matéria de arrepiar, pois sou muito fã do Bill. Espero que agora ninguém cometa injustiças como as relatadas nos “mitos” ao tentar desmerecer as conquistas de Russell. Para mim, foi o maior gênio que já pisou em uma quadra.

  • Wilt e Bill são os opostos de uma mesma posição.

    Uma coisa que não parece mas que é verdade Bill Russel, assim como Wilt, sempre teve uma grande personalidade mas também grande ego.
    E isso não é, necessariamente, uma coisa ruim.

    – Russel uma vez exigiu ter sempre o maior salário da Liga (que era o salário de Wilt + 1 dólar)
    – Russel era o maior ativista da Liga. Foi um dos fundadores do sindicatos dos atletas, foi também responsável pela primeira greve dos profissionais e se recusou a jogar várias vezes em locais onde sofreu algum tipo de discriminação. As aparições ao lado de Luther King, Malcolm X e M. Ali não são raras.
    – Russel detestava perder e o Simmons conta, no mesmo livro, como ele chegou a discutir com Auerbach (na condição de técnico) para manterem Havliceck e conseguirem continuarem competitivos e serem campeões

    Basicamente, Russel viveu uma realidade complexa enquanto jovem e atleta nos EUA dos anos ’50 e ’60 e fazia questão de deixar sua marca sobre isso sob o ponto de vista de competição extrema. Como Wilt disse “todo jogo, toda ação, era uma ação de vida ou morte”. Por outro lado, Wilt viveu o sonho americano em sua plenitude.

    Mais uma curiosidade, em um documentário da ESPN (tradução livre) sobre o jogo onde Hondo roubou a bola e o Celtics bateu Philly, existe uma grande história de Bill (já como técnico e jogador):

    Russel: “Era para ser a última posse de bola e eu queria me assegurar que íamos ganhar o jogo. Então tomei a bola da mão do Jhon e disse que iria cobrar a saída pelo fundo da quadra eu mesmo. Saí errado e Philly recuperou a bola que saiu pelo lado da quadra. Então, eu pedi tempo. Quando os jogadores chegaram perto eu disse ‘Guys, do something!’ (Galera, façam alguma coisa!) em um tom meio desesperado. Na jogada seguinte, Havliceck roubou a bola e ganhamos o jogo. Ufa!”

    Jordan é o melhor, mas Russel é o maior jogador da Liga. Por tudo que conseguiu. São 11 títulos da NBA em 13 temporadas (11/13), 2 títulos da NCAA em duas temporadas (2/2) e uma medalha de ouro nas Olimpíadas (1/1). Sem comentários.

    []s verdes

    1. Sabe de uma coisa que me magoa profundamente quando vejo grandes gênios de sua época? Quando tentam desmerecer algum lado da história, como se uma história não tivesse infinitas versões, infinitas óticas. Desmerecer Bill Russel é deixar Wilt ainda menor, e desmerecer Wilt é fazer de Russel apenas mais um. Os dois eram incríveis e o que faziam ser os maiores de sua época era justamente a existência de dois dos maiores em uma mesma época. Sorte mesmo é de quem pode ver tudo isso. É o mesmo que Magic e Bird, quando o basquete renasceu.

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