Como Avery Bradley deixou de ser um menino para se tornar um homem

Em 16 de abril, um dia depois que a irmã de 22 anos de Isaiah Thomas, Chyna, foi morta em um acidente de carro, o armador do Celtics tentava reunir forças para iniciar a série de Playoffs contra o Chicago Bulls.

Os treinadores e companheiros de equipe de Thomas mantiveram distância porque simplesmente não sabiam o quanto de espaço ele precisava. Mas, em um momento de tristeza, enquanto Thomas sentava sozinho no banco momentos antes da bola subir, Avery Bradley se aproximou e sentou ao seu lado.

Thomas chorou e cobriu o rosto com a mão. Bradley colocou o braço direito em volta do ombro de seu companheiro, enquanto batia bola na outra mão.

Há poucos dias atrás, Bradley acertou um emocionante arremesso de 3 pontos que deu ao Celtics uma vitória sobre o Cavaliers no jogo 3 das Finais de Conferência e reacendeu as esperanças da equipe na série. Depois que a bola entrou, Avery beijou as mãos e apontou para o céu, para sua mãe.

Ele estava apto a consolar Thomas no mês passado pois teve sua própria experiência de perder um ente querido. Ele certamente se lembra como foi ver a própria mãe respirando por aparelhos. Ele se lembra o quão vazio ele se sentiu para começar a jogar basquete novamente depois que ela foi embora.

E, talvez o mais importante, ele se lembra do que é preciso para superar um momento de extrema dificuldade.

Mãe trabalhadora

Alicia Jones era uma mãe solteira de quatro filhos e três empregos ao mesmo tempo quando Bradley e seus irmãos eram crianças. Ela era secretária em uma agência de serviços sociais, trabalhava na igreja e assumia turnos à noite no Walmart.

No pequeno apartamento da família, ela dormia em um sofá para que seus filhos pudessem ter as camas. Se houvessem crianças no bairro com fome, ela era o tipo de pessoa que lhes daria refeições, mesmo tendo pouco.

Mas não pense que ela mimava seus filhos. Depois de retornar do Walmart às 4 da manhã, ela ia direto checar os pratos que seus filhos tinham lavado, e se encontrasse um pingo de sujeira, ela acordaria todos para terminar o trabalho.

Em vez de limpar a cozinha, seu filho mais novo, Avery, preferia jogar basquete usando as latas de lixo como cesta, riscando o chão com seu tênis esportivo, deixando sua mãe louca. O esporte tornou-se seu foco principal, e ele se transformou em um dos melhores prospectos de basquete do Ensino Médio dos Estados Unidos. Alicia conseguia ir à alguns jogos apesar de sua apertada agenda, e todos no ginásio percebiam quando ela estava lá.

“Ela era a mãe mais barulhenta na arquibancada, sempre gritando o tempo todo”, lembra Bradley, sorrindo. “Era a marca registrada dela.”

O primeiro amor

Bradley então conseguiu uma bolsa para a Universidade do Texas. Em seu primeiro ano de faculdade, ele viu uma bela jovem aparecer no perfil de seu amigo Lavelt Page no Facebook.

“Ela não é real”, disse Bradley. – Impossível ela ser real.

Bradley estava apaixonado. Ele e Ashley Archbald começaram a conversar, e as conversas se transformaram em flertes, e flertes se transformaram em chamadas de Skype até tarde da noite.

Avery, que tinha 19 anos na época, de início não disse à Ashley que ele era um prospecto de nível NBA. E, como era mais novo do que ela, mentiu dizendo que tinha 21 anos. Eles ficaram em contato por quase um ano antes de finalmente se encontrarem. Em seguida, Ashley mudou-se para Nova York para seguir carreira em design de roupas e Bradley era especulado para ser selecionado pelos Celtics na primeira rodada do Draft. Ele disse à ela que essa proximidade era um sinal do destino.

Depois que começaram a namorar, Bradley convidou Ashley para uma viagem em família para St. Martin. Ela e a mãe de Bradley se deram bem instantaneamente. Alicia Jones disse como estava feliz por tê-la na viagem, e que era a primeira vez que Bradley apresentava uma namorada para sua família.

Ashley adorava ver as conversas de Bradley com sua mãe. Quando ele estava chateado ou animado com alguma coisa, Jones ficava esperando quietamente até ele terminar de falar. Em seguida, Bradley inevitavelmente fazia uma pausa e perguntava à sua mãe o que ela pensava.

“Agora sou eu que faço isso com ele”, disse Ashley com uma risada. – Aprendi isso com a Alicia.

No início de setembro de 2013, Avery e Ashley estavam retornando a Boston para o início da temporada da NBA, depois de passar o verão em Tacoma. Ashley estava grávida de oito meses do primeiro filho do casal, e em cerca de uma semana a mãe de Bradley iria se mudar para Boston para ajudá-los a cuidar dele.

Quando saíam da casa de Alicia em Washington, ela se levantou e acenou. Ashley saiu do carro para lhe dar um abraço. Ela já estava chamando Alicia de “mãe”, mesmo que ela e Bradley ainda não estivessem casados.

Bradley acenou do assento do motorista.

“Amor, vá dar um abraço em sua mãe”, Ashley disse à ele.

– Ela vai estar com a gente na próxima semana – disse Bradley.

“Por favor, volte lá e dê um abraço nela.”

Então Bradley saiu do carro e deu um abraço na mãe.

– Nos vemos em breve, mãe – disse ele.

‘Ela se foi’

Mais tarde naquela semana, Bradley e Ashley estavam dirigindo para Boston depois de uma rápida reunião de negócios em Nova York, quando o irmão de Bradley, Tim, telefonou. Os dois estavam brigados, e Bradley estava cansado da reunião, então ignorou a chamada.

Então Tim enviou uma mensagem de texto.

– Me ligue agora mesmo. É sobre a mamãe.

Alicia Jones, que ainda era jovem e vibrante e fazia aulas de dança aos 46 anos, sofreu um AVC – acidente vascular cerebral.

Bradley dirigiu o caminho todo em silêncio. Ashley colocou a mão em seu ombro e depois a tirou – e se ele não quisesse uma mão em seu ombro direito?

“Eu estava pensando, ‘O que eu faço? O que eu digo a ele? “, Ela disse. “Foi a viagem mais longa que já fizemos.”

Bradley partiu no primeiro vôo para Seattle na manhã seguinte.

“Quando cheguei em casa”, ele disse, “minha mãe já tinha ido para o hospital”.

Bradley ficou no hospital por quatro dias, enquanto outros vinham visitar e partiam. Um dos amigos chamou Ashley no canto e disse que estava preocupado porque Bradley não estava comendo, dormindo ou falando.

Todas as noites ele ligava para Ashley no Skype – assim como fazia durante o namoro – e eles ficavam em silêncio, às vezes durante horas, enquanto o respirador de Alicia soava no fundo. Bradley não queria falar, mas precisava saber que sua noiva estava com ele.

Depois de quatro dias, a família de Bradley o convenceu a sair do hospital e dormir um pouco. Ele chamou Ashley no Skype, colocou o telefone ao seu lado e cochilou.

Naquela noite, quando Ashley adormeceu, teve um sonho cristalino em que a mãe de Bradley entrava em uma sala carregando um bebê. Ela disse que o nome do menino era Liam.

“Ela disse: ‘Eu tenho que dar pra você agora'”, recordou Ashley. “Eu disse: ‘O que você quer dizer, Alicia?’ Ela disse que tinha que ir, e eu perguntei à ela para onde ela estava indo. E então ela só colocou o bebê em meus braços, e simplesmente saiu. ”

Ashley não tem certeza se isso fez parte do sonho ou não, mas acordou ao som de uma porta se fechando. Bradley, que ainda estava na tela do Skype, já estava acordado em Tacoma. Ele disse que tinha que voltar para o hospital, porque a condição de sua mãe havia piorado. Ele ligou para Ashley algumas horas depois.

– Ela se foi – disse ele.

Uma nova razão para viver

Quando Bradley retornou a Boston no dia 23 de setembro, após o enterro de sua mãe, ele estava arrasado.

“Ele não tinha mais vontade para viver”, disse Page, seu melhor amigo. “Sua mãe era sua fortaleza, sua espinha dorsal.”

– Fiquei no fundo do poço – disse Bradley. “Eu não estava comendo. Eu não estava bebendo. Tudo o que fiz foi chorar. Minha própria esposa não conseguia me fazer falar. E ao chegar em casa, tudo que eu pensava era, ‘Como vou trabalhar depois de tudo isso?’ ”

O Celtics estava se preparando para começar sua pré-temporada, e Bradley enfrentaria perguntas insignificantes sobre tempo de quadra, extensões de contrato, e aproveitamento de 3 pontos. Ele desembarcou no aeroporto de Boston depois de um difícil vôo e ligou para Ashley às 7:59 da manhã para dizer à ela que ele havia chegado.

Ela não sabia como o consolar. Poucos minutos depois, ela se sentou na cama, e sua bolsa de água estourou. Ela ligou imediatamente para Avery de volta.

“Tem certeza?” Ele perguntou.

“Tenho certeza.”

“Ashley, por favor, tenha bastante certeza, porque essa é a única felicidade que eu teria na minha vida agora”, disse ele. “Estou indo direto para casa agora.”

Ashley sentou-se no banco da frente durante o trajeto para o hospital, e Bradley podia sentir perfeitamente o bebê se movendo quando colocava a mão na barriga.

Depois de um trabalho de parto de 24 horas, o bebê do casal nasceu às 8h13 do dia 24 de setembro. Durante o parto, Bradley tremeu e lágrimas escorreram pelo seu rosto. Ele estava devastado e feliz …de coração quebrado e sorriso abençoado ao mesmo tempo.

“Ele não largou aquele bebê fora de sua vista nem por um segundo”, disse Ashley. “As enfermeiras disseram que tinham que limpá-lo e dar-lhe um banho, e Avery respondeu, ‘deixe que eu vou dar o banho.’ Então ele que deu seu primeiro banho.”

Durante as primeiras semanas, Bradley sentava-se em uma cadeira de balanço em casa e embalava o menino em seus braços até adormecer. O bebê foi registrado oficialmente como Avery Bradley III, mas eles o chamariam de Liam, o nome mencionado pela mãe de Bradley no sonho.

Cerca de um ano depois, o casal estava falando sobre esse sonho e eles acharam um pouco engraçado que de todos os nomes do mundo, Liam foi o que surgiu. Então eles pesquisaram o significado do nome Liam: “Vou salvar meu pai.” Os dois lembram de como ficaram arrepiados no momento.

Um jogador, pai e marido melhor

Toda vez que Bradley converte um arremesso de 3 pontos, ele beija sua mão direita e aponta para o céu para sua mãe. Ele ainda pensa nela todos os dias.

Alicia Jones estava tão orgulhosa de seu filho mais novo. Ela teve seu primeiro filho aos 15 anos, e apenas um dos irmãos de Avery se formou na escola. E agora aqui estava seu bebê indo para a faculdade, e depois para a NBA, e então prestes a se tornar um pai.

“Eu acho que ela estava feliz por mim”, diz Bradley. “O mais importante, não era o jogador de basquete que eu estava me tornando, mas sim o homem que eu estava me tornando. ”

Ele gostaria que sua mãe pudesse vê-lo cuidar de sua própria família hoje em dia. O casal agora tem dois meninos, e uma menina deve chegar em agosto. Eles já escolheram o nome: Alicia-Marie, misturando o primeiro nome da mãe de Bradley com o nome do meio de Ashley.

Com um ano de idade, Ashton tem um rosto e traços que parecidos com a avó que ele nunca conheceu.

Liam, agora com 3 anos, já consegue entender que seu pai é uma estrela da NBA. Ele adora ir aos jogos do Celtics com sua camisa, e se seu pai não vai falar com ele antes da bola subir, será cobrado pelo filho depois. Na casa da família, Liam corre pela sala de jantar como se fosse um jogador sendo anunciado na formação inicial de Boston. Quando finge ser seu pai, ele dá um olhar sério e concentrado.

“Papai faz essa cara de mal nos jogos, ele não sorri.”

Os sorrisos de Bradley aparecem mesmo em casa. Sua preferência é por ficar de fora do centro das atenções, fora das redes sociais e longe da vida noturna da NBA. Essa vida nunca fez o tipo dele.

Em casa, ele brinca no chão com seus filhos, coloca uma música e dança com sua sogra, ou reúne todos na sala de estar para assistir um filme. Quando eles estão na sua casa de férias em Austin (Texas) ele coloca animadamente todos no carro para dar uma volta pela cidade.

Bradley, que a cada temporada vê a pressão de assumir um papel maior aumentar, está muito consciente de que o seu lugar no mundo do esporte será temporário. O veterano que completou 7 anos de liga sabe que será lembrado por grandes momentos, como o seu arremesso de 3 pontos contra Cleveland na Final de Conferência. Mas ele também não vê motivos para esperar até que sua carreira acabe para causar impacto em outros lugares.

Ele assistiu recentemente à um documentário sobre as condições de vida no Haiti e prometeu ir lá em breve para ajudar. Ele já construiu quadras de basquete dentro de comunidades em Grenada e Trinidad. Ele participou de video-conferências com soldados norte-americanos que servem no exterior.

“A maneira como Avery vê a vida é que, o jogo de basquete dura apenas duas horas”, disse sua esposa. “E as outras 22 horas? O que você faz para tornar a vida de alguém melhor? ”

É uma visão que ele herdou da mãe. E mesmo que ela já tenha ido embora, as lembranças de Bradley e os constantes ensinamentos dela fazem parecer que ela nunca se foi realmente.

“Ela ainda me faz querer ser um pai melhor”, disse ele, “um marido melhor, um jogador melhor, uma pessoa melhor”.

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Respostas de 16

  1. Espetacular a matéria! Parabéns pelo texto, pela emoção e pela forma que foi exposto.

    Considero ainda mais o Bradley agora. Não só como grande jogador, mas como ser humano!

  2. Bradley é monstro…gosto muito do seu jogo, se ele renovasse por 13 a 15 milhoes por ano… seria um steal para nos…. mas com certeza ele vai querer mais de 20 milhoes…

  3. Emocionante, que história de vida! Parabéns Bradley e espero que você continue por muito tempo no Celtics!!

  4. Minha nossa, que matéria espetacular!
    Sabia que tinha mais naquele abraço no Thomas que a imagem conseguia mostrar!

    []s verdes

  5. Lembro que na primeira temporada desse cara eu sempre me perguntava :”Como pode esse cara ser jogador da NBA? Horroroso!” , que legal ver ele hoje, um jogadoraço, líder, efetivo demais na defesa, e um jogado bem confiável no ataque. Nem sabia o que se passava na vida do cara, fora o fato da minha falta de paciência na sua época de Rookie.
    Que Deus abençoe AB mais e mais!

    Let´s Go Celtics!

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