Dúvidas e constatações da temporada

Um começo ruim, a dúvida sobre os motivos, o retorno de Bradley, a rápida ascensão da equipe, uma nova sequencia de derrotas e um treinador perdendo a paciência e ameaçando seu elenco.

Esse é o resumo rápido do que tem sido o Celtics até o momento. Um resumo ruim e que fica ainda pior se destrinchado em um texto mais amplo.

Mas prepare-se, pois é tanta coisa errada, que o texto abaixo deve realmente ser amplo, muito amplo.

Como muitos sabem, todo ano sou comedido em realizar criticas gerais a equipe e em descartar campanhas. Sou torcedor do Celtics a muitos anos, calejado e sei mais do que ninguém a capacidade de reação dessa franquia e o poder que ela adquiri instantaneamente no momento em que a palavra “Playoffs” entra na conversa.

Por muitas temporadas tive que vir aqui dizer que “tudo vai ficar bem” para torcedores em estado de pânico assim que uma sequencia de derrotas, ou até mesmo uma derrota isolada para um rival, acontecia.

Mas dessa vez não vou fazer o mesmo, pelo simples motivo de que vejo o Celtics tomando um rumo diferente, nessa temporada.

Posso quebrar a cara e morder a língua. A equipe pode sofrer uma reviravolta enorme depois dos últimos discursos de Rivers e começar a ganhar tudo, mas pra mim isso é muito difícil de acontecer.

O Celtics outrora exemplo de organização tática e garra, hoje é um emaranhado de jogadores se estranhando em quadra e outros mostrando a mínima vontade e poder de reação.

Doc Rivers fez críticas contundentes a essa equipe na noite de ontem. Palavras duras mas que explanam de forma totalmente correta o que é o Celtics hoje e o que deve ser feito daqui pra frente se mudanças não vierem.

O único pesar disso tudo, é que tal declaração deveria ter vindo de um gerente da franquia ou da imprensa e não de Doc Rivers, pois ele é tão culpado pelo atual momento quanto seus jogadores, então não acho que cabe a ele fazer tal pronunciamento, sobre o risco de aparentar estar jogando toda a culpa nas costas dos demais (isso se não for essa mesmo a intensão).

Dito isso, vamos abaixo citar alguns dos motivos que estão levando o Celtics em direção a uma grande crise:

Falta altura e força no garrafão.

Esse tópico não é novidade para ninguém. Qual o torcedor do Celtics que nunca pediu por reforço no garrafão, mesmo antes da temporada começar?
Desde a troca de Perkins, a equipe de Boston vive as voltas com sua fragilidade no garrafão, tanto na parte ofensiva quanto na defensiva.

Grande parte desse problema, verdade seja dita, podemos computar ao azar, afinal perdemos Darko Milicic antes mesmo da temporada começar por conta de problemas pessoais com o atleta e depois perdemos Wilcox, atleta que vinha fazendo brilhante trabalho ofensivo nos poucos minutos de quadra que lhe eram permitidos.

Sem os dois atletas, passamos a contar mais do que nunca com Garnett, Bass e Sullinger, um calouro que ainda não sabíamos o que esperar.

Quarenta rodadas e passaram e a certeza para torcida é uma só. Sullinger é muito superior a Brando Bass.

Tirando as faltas bobas que em alguns momentos limitam seu tempo de quadra, Sullinger não parece em nada com um calouro.

19 minutos de quadra em média, foram o suficiente para mostrar que Sullinger é melhor que Bass nos rebotes, na proteção ao garrafão, na defesa individual, na presença ofensiva e na pontuação em baixo da tabela. Os números mostram isso e a diferença a favor do novato é gigantesca.

No entanto, Sullinger continua sendo reserva, talvez por opção tática, talvez porque Doc ainda considere Bass melhor .

Sendo assim, com Bass iniciando as partidas e cometendo os erros defensivos de sempre, em certo ponto até piores que do ano passado, sobra para KG proteger o garrafão, certo?

Errado, pelo menos em partes.

KG ainda é um grande defensor homem contra homem, mas a cada ano que passa sua vitalidade física e velocidade diminuem e hoje Garnett não consegue mais marcar pick and Roll com eficiência e raramente se arrisca a colocar seu corpo a frente de jogadores que infiltrem, mesmo que sejam pequenos armadores.

Essa falta de proteção ao garrafão, unida a lentidão e inaptidão defensiva de Bass tem gerado muitos pontos e rebotes adversários que frequentemente tem dominado nosso garrafão.

KG no entanto tem subido muito de produção quando atua ao lado de Sullinger.
Juntos, como já mostrado em outra matéria escrita por mim, eles causam muitos estragos aos adversários tanto na parte defensiva quanto na ofensiva, isso porque Sullinger faz todo aquele trabalho sujo que KG tem evitado fazer.

Mas aí chegamos no ponto em que paramos e pensamos a frase acima.
Quer dizer que Garnett amplia em muito o rendimento de seu jogo quando está ao lado de Sullinger?
Mas não deveria ser o contrário? Não deveria Garnett elevar o nível de seus companheiros ao invés de ter o seu elevado por um calouro? Pense nisso.

Improvisações e falta de flexibilidade tática

Muita gente culpa Ainge pela falta de opções no garrafão, ainda ressentidos pela troca de Perkins a 3 anos atrás, mas vamos ser honestos, Ainge dessa vez não tem culpa.

Lembro como se fosse ontem uma declaração de Doc Rivers antes da temporada passada, dizendo para Ainge buscar TALENTOS para reforçar a equipe, independente da posição, que depois ele encontraria uma forma de encaixar os atletas no esquema.

O resultado disso? Um monte de Ala-armadores jogando improvisados de armadores e um monte de Alas de força jogando de pivô, simplesmente porque Doc Rivers acha ter o toque de midas e capacidade de ensinar novos truques a macacos velhos, tentando alterar posição e características dos jogadores, obrigando eles a se adequarem a um esquema tático, quando na verdade o correto seria adequar o esquema as características dos jogadores disponíveis.

Sub-utilização de uns, excesso de outros.

Esse é um problema visível no Celtics desde os primeiros jogos.

No entanto a impressão inicial é de que faltava entrosamento para a equipe e que com o tempo isso seria minimizado.

No entanto não é isso que vimos ocorrer, e depois de 40 rodadas o que se vê em quadra é o retrato fiel do que foi no início.

Porém esse é um aspecto difícil de avaliarmos os culpados. Os motivos podem ser vários:

• Rondo não confia em alguns companheiros e por isso concentra seus passes em outros
• Rondo apenas está cumprindo ordens de Doc Rivers de concentrar o jogo em determinados jogadores dos quais Doc acha mais confiáveis.
• Alguns jogadores não estão se movimentando corretamente em quadra e por isso recebem menos a bola.
• Alguns jogadores estão sendo utilizados como “chamariz”, aquele cara que corre pra ponta só pra abrir a marcação, mas que não vai participar da jogada, tática essa que Ray Allen utilizou como argumento em sua saída, dizendo não querer ter essa função na equipe.

O fato é que esse procedimento claramente está limitando o poderio ofensivo da equipe e provavelmente prejudicando alguns jogadores.

Existe algumas estatísticas avançadas na NBA que mostram o quanto um jogador é envolvido nas jogadas de ataque de sua equipe, quando está em quadra.

Olhando essas estatísticas podemos ver, por exemplo, que Courtney Lee é o jogador que menos é acionado nas jogadas ofensivas do Celtics. Até Jason Collins, pasmem, é mais acionado que ele.

Lee, no entanto é disparado o ala-armador com melhor aproveitamento nos arremessos em Boston, com ótimo 48% de FG.

Sendo assim, porque Lee não recebe mais bolas? Porque ele é o jogador que menos é procurado pela equipe toda?

Querem outro jogador pouco utilizado? Jared Sullinger

O Ala de força que tem aproveitamento de 50% de seus tiros e que é disparado o melhor reboteiro da equipe só recebe as bolas em suas mãos em 19% das jogadas ofensivas do Celtics.

Se levarmos em conta que Sullinger tem obtido muitos rebotes ofensivos, o que faz com que ele participe da jogada ofensiva mesmo que ninguém tenha tocado pra ele, ficamos mais preocupados ainda em imaginar qual seria a porcentagem de utilização dele se levarmos em conta apenas os passes dos companheiros.

Por outro lado, quase um terço das jogadas ofensivas do Celtics passam pelas mãos de Paul Pierce, o Ala que nessa temporada está arremessando mais bolas do que em todas as temporadas desde que o big 3 foi formado e que com isso vem obtendo seu pior aproveitamento de arremessos desde 2003, dez anos atrás.

Falta de variação tática.

Esse tópico já foi abordado acima, mas vou explanar melhor.

Doc Rivers junto com seus assistentes Tom Thibodeau e posteriormente, Frank Lawrence, desenvolveu um complexo sistema defensivo e ofensivo em 2008, que se baseava nas seguintes premissas:

Formação ofensiva: A equipe praticava um basquete cadenciado, de “meia quadra”, com um armador controlando o jogo quase que o tempo todo e os demais atletas se movimentando em sucessivos corta-luz que resultavam em atletas aparecendo livres para o arremesso a todo momento.

Formação defensiva: Pivôs e Alas de Força constantemente avançavam a marcação, dobrando sobre jogadores que tivessem a posse de bola, dificultando a infiltração e forçando a arremessos com uma boa contestação, o que enfraquecia um pouco a produção de rebotes mas compensava com a redução de eficiência nos arremessos adversários.

Esse esquema de jogo foi um sucesso nos primeiros anos do big3, pois o Celtics tinha o material humano ideal para a realização de cada função.

No entanto os anos foram passando, os atletas foram envelhecendo e não era mais possível realizar o mesmo plano de jogo com a mesma eficiência.

A alternativa encontra, pelo menos na parte ofensiva foi de contratar jogadores que pudessem criar seus próprios arremessos e outros que pudessem jogar em velocidade para atender o desejo de Rondo de explorar mais jogadas em transição.

Para atender tal demanda, Ainge contratou Lee, Terry, Barbosa e Green. Ótimas contratações que teoricamente fariam do Celtics a equipe com o melhor elenco da NBA, voltando a ser concorrente pelo título.

Mas aí entrou o problema da falta de variação tática.

o Celtics agora tinha as ferramentas que sonhava em mãos, mas elas foram utilizadas corretamente? Não!

O discurso de trabalhar em transição nunca foi colocado em prática. O Celtics continua a jogar o basquete lento e de meia quadra.

Barbosa que deveria ser o homem a correr para receber essa bola em velocidade foi inicialmente deslocado para a armação das jogadas e depois passou a ser pouco utilizado pelo treinador, chegando a ficar de fora de algumas partidas.

Terry, Lee e Green tem raros momentos na partida onde podem conduzir a bola e buscar suas jogadas individuais. A bola continua concentrada quase o tempo todo nas mãos de Rondo, o que evita que jogadas individuais sejam criadas.

Sendo assim, existem duas alternativas para o Celtics.

Ou Doc Rivers coloca em prática o seu discurso que até agora só ficou no papel e altera a forma de jogar da equipe, adaptando o esquema tático e as movimentações aos novos contratados, ou realiza trocas e busca jogadores que tenham como característica receber a bola e já arremessar, o famoso “Catch and Shoot”.

Aliás, procure no Goole pela palavra “catch and shoot” e sabe o que você vai ver como primeiro resultado? um vídeo de JJ Redick, ala-armador do Magic que semana passada foi envolvido em rumores com o Celtics. Coincidência?

Considerações finais

Bom gente, acho que escrevi meu maior texto em 4 anos de Celtics Brasil e acreditem, eu ainda poderia escrever bem mais aqui sobre outros erros menores que vejo na equipe este ano, no entanto acho que o “básico” já foi abordado.

Como podem ver, essa é uma coluna de opinião, não a opinião do Celtics Brasil e sim a minha (Daniel Emiliano).

não sou dono da verdade, posso estar equivocado em uma coisa ou outra, quem sabe até em tudo, mas isso tudo é o que eu acho no momento.

Gostaria agora de ouvir a opinião de vocês. Concordam? Discordam?